Na minha exígua jornada de estudos sobre filosofia, talvez um dos textos mais marcantes para mim tenha sido o discurso da servidão voluntária, escrito por Étienne de La Boétie. Tal escrito afloram de uma simples pergunta: “por que os homens escolhem de livre e espontânea vontade servir a um outro?”.
Em outras palavras, por que se dá tanto poder a um tirano? Afinal, como pode um simples e relés mortal ter tanta influência sobre tantos outros? Como pode o imenso poder de um povo ser inibido diante de tamanha pequenês de um homem que se acha grande?
Como se pode perceber, tal exercício mental feito por Étienne em seu ensaio só abre o campo para mais perguntas: o leque de questionamentos criou ramos e rizomas que podem ser percebidos até hoje.
Mas por que não deixar a questão por resolvido? Oras, esse tal de Étienne responde de forma satisfatória tal pergunta: “os homens servem pois acreditam em uma ética onde se beneficiam disso, acreditam que ao servir ao grande tirano eles mesmos podem desfrutar de serem pequenos tiranos, exercendo seu pequeno poder”.
É comum então que digam que a filosofia não sirva para nada, afinal, se pensa, pensa e pensa mas não se sai do lugar, qual é o ponto? Muitos dizem que a filosofia está ultrapassada, como um “velho sábio” que teve sua importância em algum ponto, mas hoje não tem mais serventia. Mas será verdade?
Vejo que talvez seja necessário trescalar os prazeres de se pensar, de rearranjar pensamentos que muitos acreditam ter se tornado tão sólidos, máximas monolíticas de um “saber puro”, a mentira de que “tudo que se pode pensar já foi pensado”, assim como o mito do “fim da história” de Fukuyama.
Nessa jornada, rejeitamos a servidão, superamos nosso luxo de se “pensar ao fim de nada” para um pensamento “à nada”. Nos aventuremos então em territórios de modos de vida não servis, pois a filosofia que nos interessa é aquela que “não serve à nada”.